Entrevista com Fabrício Cavalcanti

fabricio-cavalcanti-7

Fabrício Cavalcanti (nascido em 16 de março de 1975) é um ator e diretor de cinema paulista, herdeiro da tradição do cinema popular brasileiro. Filho do lendário cineasta Francisco Cavalcanti, cresceu imerso na atmosfera da chamada “Boca do Lixo”, onde teve suas primeiras vivências nos bastidores da sétima arte.

Atuou em diversos filmes do pai, como Aberrações de uma Prostituta (1981) e Ivone, a Rainha do Pecado (1984). Ele dirigiu e roteirizou um curta chamado A Nova Moeda (2002) e um longa, A Pensão (2004).

Vamos às 7 perguntas capitais:



1) É comum lembrarmos com carinho do início da nossa relação com o cinema. Os filmes ruins que nos marcaram, os cinemas frequentados (que hoje, provavelmente, estão fechados), as extintas locadoras de VHS e DVD que faziam parte do nosso cotidiano. Conte-nos um pouco de como é sua relação com a 7ª arte. Quando nasceu sua paixão pelo cinema? 

F.C.: Minha mãe foi roteirista da maioria dos filmes da Plateia Filmes/Ribalta Filmes. Quando criança, ela morava literalmente dentro de um cinema, o Cine Belenzinho, localizado em frente à Igreja São José do Belém, perto do bairro do Brás, em São Paulo. Hoje, no lugar do antigo cinema, funciona uma agência do Bradesco. Minha avó materna era gerente geral do recinto e, além do trabalho, recebia moradia no local.

O destino quis que minha mãe se casasse com um cineasta de filmes populares, e assim eu vim ao mundo. Minhas primeiras memórias são dos sets de filmagem. Para muitos, a sétima arte alimenta a alma; para mim, ela alimenta a alma e o corpo, é o meu pão de cada dia.


2) Com relação às suas preferências cinematográficas, há uma lista dos filmes de sua vida? Um Top 10 ou mesmo o filme mais importante? 

F.C.: São muitos os filmes que marcaram a minha vida, é difícil escolher apenas um. Entre eles, destaco O Poderoso Chefão, de Francis Ford Coppola, e Doutor Jivago, de David Lean. Gosto muito também dos filmes da Boca do Lixo: O Porão das Condenadas, dirigido pelo meu pai, Francisco Cavalcanti; À Meia-Noite Levarei Sua Alma, de José Mojica Marins; e os trabalhos do "Rei da Boca", Clery Cunha.

Gostaria de destacar especialmente O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte. Tive o privilégio de ouvir do próprio Anselmo a saga dessa produção, que conquistou um feito histórico: é até hoje o único filme brasileiro a vencer a Palma de Ouro no Festival de Cannes, e continua sendo um dos filmes nacionais mais premiados no mundo.


3) "Nossas vidas são definidas por oportunidades, mesmo as que perdemos.", diria Benjamin Button em seu filme. O caminho até o eventual sucesso não é fácil, principalmente na concorrida Indústria Cinematográfica. Quais foram suas maiores influencias para se tornar cieasta?

F.C.: Minha Disneyland foi a Hollywood do cinema paulista: a Rua do Triunfo, conhecida pelos chamados "pseudos-intelectuais" e por alguns críticos de cinema como “a Boca do Lixo” ou o reduto do cinema marginal. Para mim, a Rua do Triunfo foi mais que uma universidade, foi uma escola de vida e de arte. Lá vi desfilarem grandes ícones do nosso cinema, como o premiado Ozualdo Candeias, Anselmo Duarte e Amácio Mazzaropi.

Minha maior influência foi meu pai, o amor que ele nutria pela sétima arte e sua capacidade de driblar todas as dificuldades, mesmo com os resultados variando nas bilheteiras. Construiu uma carreira digna, com muitos filmes em seu currículo. Não sei se o amor pelo cinema é genético, mas o fato é que vivo do audiovisual e das readaptações que precisei enfrentar ao longo do tempo para continuar levando o pão de cada dia para casa.


4) "A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos". Considerando a reflexão, há alguma experiência vivida no meio artístico que foi especialmente marcante?

F.C.: Não sei se são exatamente marcantes, mas, devido ao baixo orçamento que tive para realizar a maioria dos meus filmes, vi a criatividade ser colocada à prova em diversos momentos. Já vi tapete de sala virar travelling; cinegrafista literalmente montado no cangote de seu assistente musculoso para realizar um movimento de grua; tripés de refletores sendo transformados em metralhadoras cenográficas. 

Antes do After Effects, chegamos a arranhar manualmente os fotogramas do negativo, desenhando faíscas quadro a quadro para simular os tiros dos revólveres. São muitas histórias. Lindas lembranças, e uma prova viva de que a limitação orçamentária pode ser o combustível da invenção.


5) Imagine o cenário: você é um diretor (de qualquer país) no set de filmagem de um filme memorável. Quem seria, em qual filme, e por que essa experiência seria tão marcante para você?

F.C.: Seria Alfred Hitchcock ou, antes dele, Cecil B. DeMille, não por um filme específico, mas pela capacidade de ambos aliarem talento artístico a uma indústria cinematográfica fantástica, que potencializa qualquer vocação.


6) Fazer cinema envolve muitas variáveis. Esforço, investimento, paixão, talento... E a sinergia destes elementos faz o resultado. Qual trabalho em sua carreira considera o melhor?

F.C.: Gosto muito, no meu trabalho, dos filmes O Regenerado, A Pensão, Dignidade.com e Chanchada. Mas vou "surrupiar" uma frase que meu pai sempre dizia, e da qual eu gosto muito: “Meu filme predileto é o próximo que farei.” O teatro tem uma grande vantagem sobre o cinema: você pode aperfeiçoar a cada apresentação.

M.V.: E quanto a arrependimentos? Ou, caso não tenha, faria algo diferente?

F.C.: É tão difícil realizar uma obra cinematográfica que não há espaço para arrependimento, apenas orgulho. Mas, se compararmos com o teatro, seria maravilhoso poder aperfeiçoar o trabalho a cada apresentação. Seria ótimo poder continuar aprimorando o filme mesmo depois de finalizado e masterizado.


7) Para finalizar, deixe uma frase ou pensamento envolvendo o cinema que representa você.

F.C.: Vou resumir: "A cobiça envenenou a alma dos homens… levantou no mundo as muralhas do ódio… Precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido." “O grande ditador”, de Charlie Chaplin

M.V.: Obrigado amigo. Foi uma honra

F.C.: Grato pela oportunidade. Forte abraço.

 
Tecnologia do Blogger.