Entrevista com Rodrigo Cunha

O carioca Rodrigo Cunha é jornalista e crítico de cinema, formado em Cinema pela Universidade Estácio de Sá, no Rio de Janeiro. Apaixonado pela sétima arte desde cedo, fundou em 2003 o Cineplayers, projeto que se tornou referência entre os cinéfilos, reunindo site e canal no YouTube com conteúdos dedicados ao universo cinematográfico.

No Cineplayers, é uma figura central, atuando em críticas, comentários, notícias e reflexões sobre a indústria cinematográfica. Além do site, ele também contribui com outros veículos e plataformas, ampliando sua atuação como divulgador e entusiasta do cinema.

Vamos às 7 perguntas capitais:


1) É comum lembrarmos com carinho do início da nossa relação com o cinema. Os filmes ruins que nos marcaram, os cinemas frequentados (que hoje, provavelmente, estão fechados), as extintas locadoras de VHS e DVD que faziam parte do nosso cotidiano. Conte-nos um pouco de como é sua relação com a 7ª arte. Quando nasceu sua paixão pelo cinema? 

R.C.: Sempre gostei de ver filmes, mas foi quando conheci o Betinho, primo de uma ex-namorada, que minha relação com o cinema começou a mudar. Ele assistia a filmes e diretores bem mais conceituados, e aquilo me chamou muito a atenção. Foi em 2001 que descobri nomes como John Carpenter, Anthony Mann, Brian De Palma, Sam Peckinpah, entre outros. Já comecei com os grandes, graças a ele.

Essa descoberta acabou afetando diretamente o que viria a ser o Cineplayers, criado dois anos depois, mesmo que minha preferência pela Hollywood clássica seja evidente para quem me acompanha há mais tempo. O primeiro filme mais cultuado que vi foi Vampiros, do John Carpenter, logo após o Betinho ter ganhado um DVD da Gradiente, um daqueles cinzas, grandões. O impacto visual daquilo foi tremendo para mim.

2) Tyler Durden disse em Clube da Luta: "As coisas que você possui acabam possuindo você". Ser colecionador é algo que se encaixa neste conceito, já que você se torna escravo do colecionismo. Coleciona filmes, CDs ou algo relacionado à 7ª arte? 

R.C.: Sempre gostei de colecionar, mas passei por um hiato por falta de espaço. Cheguei a ter cerca de 800 filmes em DVD, mas acabei me desfazendo da maioria, literalmente, não havia mais espaço em casa. Dei alguns para amigos e leitores. De alguns eu me arrependo, especialmente os que se tornaram raros e cujo valor de mercado aumentou bastante, como é o caso do coreano Primavera, Verão, Outono, Inverno... E Primavera.

Engraçado que o Blu-ray nunca chegou a me conquistar de verdade. Acho que isso se deve ao fato de eu ter mudado o meu foco como colecionador: se antes eu comprava qualquer filme popular de que gostava, hoje, com os serviços de streaming e filmes OnDemand, passo a adquirir apenas aqueles títulos que são muito difíceis de encontrar nessas plataformas.

Atualmente, tenho comprado bastante material da Versátil, que vem fazendo um trabalho brilhante ao resgatar a filmografia de diretores importantes e raros de se encontrar em larga escala, como John Cassavetes, Jean-Pierre Melville, Mario Bava, Samuel Fuller, Andrei Tarkóvski, entre outros.

3) A criação do seu site "Cineplayers" veio de uma necessidade pessoal de se comunicar sobre a 7ª Arte? E em que momento essa ideia tomou forma?

R.C.: Com o meu crescente interesse por cinema, comecei a frequentar a área dedicada ao tema em um fórum de games chamado Players, que existe até hoje e já era um espaço bastante ativo na época, sou rato velho de internet. Ao lado de três amigos. Alexandre Koball, Tony Pugliese e Ary Monteiro, montamos a primeira versão do Cineplayers, com a ideia de reunir os textos que escrevíamos nos fóruns de lá. Em 10 de janeiro de 2003, nascia o site, todo atualizado manualmente via FrontPage. Era uma trabalheira danada.

Alguns anos depois, lançamos a primeira versão automatizada, sempre mantendo a proposta de criar um espaço que abrigasse o maior número possível de opiniões divergentes e honestas, algo que cultivamos até hoje. 

Quem visita o Cineplayers sabe que ali se encontra todo tipo de crítico e leitor: dos apaixonados por cinema clássico aos que buscam apenas uma diversão descompromissada. E esse, acredito, é justamente o nosso grande diferencial.

Muita gente já me contou que chegou ao site conhecendo apenas o básico, e acabou se aprofundando nos estudos sobre cinema a partir dali. Veja bem, não falo apenas das nossas críticas, que formam um dos maiores bancos de dados do Brasil (se não do mundo), mas também dos textos dos leitores, que se dedicam e escrevem com tanta qualidade quanto nós.

Há muito conteúdo a ser explorado no site, e tenho muito orgulho disso.

4) "A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, dance, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos". Considerando a reflexão, há alguma experiência vivida no meio artístico que foi especialmente marcante?

R.C.: Quando vi O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei, foi como ter um delírio. Sempre fui jogador de RPG de mesa, e assistir àquele filme na tela grande, ao lado de amigos com quem dividi tantas fichas preenchidas e dados rolados, teve tudo a ver com as experiências que eu já havia vivido até então. Foi, sem dúvida, inesquecível. 

O filme com o qual mais chorei no cinema, e confesso que passei vergonha, foi Marley e Eu. Sempre amei cachorros, mas nunca pude ter um, porque minha família não era muito favorável à ideia. Tivemos uma tentativa, mas, nesses azares da vida, nossa cachorrinha morreu muito cedo. Foi um trauma enorme, e o filme resgatou tudo isso em mim. A mesma coisa aconteceu com o japonês A Partida, que fala de maneira sensível e poética sobre a relação entre pais e filhos, algo que valorizo profundamente por motivos pessoais.

Mais recentemente, Carol me fez lembrar por que amo tanto o cinema. Não é pela sua complexidade, porque ele não é um filme complexo, mas pela forma como consegue dialogar com o sentimento através da técnica, das luzes, dos planos estilosos, da música... É um filme perfeito para mim. 

Tive também experiências inesquecíveis com diretores como Hitchcock, Godard, Coppola, Woody Allen, Billy Wilder, John Ford, John Huston, Sergio Leone, entre tantos outros. O Desprezo é um dos filmes mais lindos que já vi na vida. E, por fim, meu título favorito de filme é brasileiro: Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo. São apenas curiosidades, mas que me definem como cinéfilo.

M.V.: Quando assisti O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei, saí do cinema em um êxtase tão grande que, naquele momento, entendi o que era testemunhar um grande épico da minha geração.

5) Com relação às suas preferências cinematográficas, há uma lista dos filmes de sua vida? Um Top 10 ou mesmo o filme mais importante? 

R.C.: Sim, mas isso é muito pessoal. Esses 10 filmes, não necessariamente, indicam que foram os 10 melhores filmes já feitos. Por ordem alfabética: 12 Homens e uma Sentença (1957), 2001: Uma Odisseia no Espaço (1968), Antes do Amanhecer (1995), Apocalypse Now (1979), Aurora (1927), Casablanca (1942), Chinatown (1974), O Circo (1928), Corrida Sem Fim (1971), Crepúsculo dos Deuses (1950), Curtindo a Vida Adoidado (1986), O Desprezo (1963), Eles Vivem (1988), Era uma Vez na América (1984), Era uma Vez no Oeste (1968), Os Goonies (1985), Harakiri (1962), Janela Indiscreta (1954), Manhattan (1979), A Marca da Maldade (1958), Matar ou Morrer (1952), Meu Amigo Totoro (1988), No Silêncio da Noite (1950), Onde Começa o Inferno (1959), O Poderoso Chefão (1971), Psicose (1960), Pulp Fiction: Tempo de Violência (1994), Tragam-me a Cabeça de Alfredo Garcia (1974), O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei (2003), O Sétimo Selo (1957), Sonhos (1990), Tempos Modernos (1936), Um Corpo que Cai (1958), Um Estranho no Ninho (1975).

São meus filmes favoritos, acho que tem mais de 30 aí.

M.V.: 34 (risos). 

6) Fale um pouco sobre os seus próximos projetos. 

R.C.: Atualmente, estou fazendo a curadoria de um evento que acontecerá no Rio de Janeiro em 2017, reunindo games, cinema, animes e muitas outras atrações voltadas ao universo nerd. O Rio ainda é muito carente nesse sentido, e acreditamos que há um grande potencial de consumo cultural na cidade, especialmente após o aquecimento promovido pelos Jogos Olímpicos.

Quanto ao site, estamos passando por uma reestruturação completa, com o objetivo de ampliar o foco no aspecto social e, claro, incorporar as novas tecnologias. Estamos investindo na responsividade, para que o site funcione bem em todas as telas, celulares, tablets, TVs e afins. Além disso, vamos retomar em breve o nosso podcast e pretendemos investir em vídeos, pois esse é o formato do presente. No entanto, jamais deixaremos de lado os textos longos e detalhados pelos quais somos conhecidos e reconhecidos.

7) Ao olhar para sua trajetória, qual aprendizado considera mais valioso e gostaria de compartilhar?

R.C.: Que as pessoas consigam amar umas às outras da mesma forma que amam as coisas desimportantes desta vida. O cinema tem muito disso.

M.V.: Obrigado pela sua atenção, amigo. Sucesso!


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